segunda-feira, 16 de abril de 2012

Roberto Civita, dono da Editora Abril, será convocado para CPI Cachoeira

Enviado por luisnassif,Coluna Econômica - 11/04/2012
 
No final da tarde de ontem, o blogueiro Ricardo Noblat informou que foi aprovada a CPI Mista Câmara-Senado sobre o caso Carlinhos Cachoeira. Um dos primeiros convocados será o dono da Editora Abril, Roberto Civita. O episódio, em si, deverá provocar mudanças substantivas no modo de fazer jornalismo. Mais do que uma ameaça à liberdade de imprensa, deverá fortalecê-la, na medida em que viabilizará a criação de órgãos de regulação – como o Conar, o conselho de auto-regulação do mercado publicitário.
A aventura de Roberto Civita é imensamente mais grave que a de Rupert Murdoch – o magnata australiano que acabou com um jornal centenário na Inglaterra, por abusos contra direitos individuais. O jornal de Murdoch associou-se a setores da polícia para obter informações sigilosas de inquéritos e promover escutas contra celebridades. Coube a um jornal concorrente, The Guardian, denunciar a trama. Como consequência, o jornal de Murdoch sofreu um enorme boicote de anunciantes e uma série de processos que culminaram na prisão de alguns dirigentes. Por outro lado, o governo inglês promoveu mudanças significativas na regulação da mídia, por considerar que o órgão regulador (controlado pelos próprios veículos) não cumpriu seu papel. Os tabloides ingleses já foram os mais execráveis periódicos de qualquer economia desenvolvida. Sem limites, foram exorbitando até bater nos limites legais. Daqui para a frente, certamente haverá um enorme avanço na qualidade da imprensa britânica. No caso de Civita, a parceria não foi com setores da polícia, mas com o próprio crime organizado, a organização criminosa de Carlinhos Cachoeira. O bicheiro ajudou a eleger o senador Demóstenes Torres. A revista Veja incumbiu-se de transformá-lo em político influente, através de uma série de matérias enaltecendo-o. Com o poder conferido pela revista, Demóstenes pressionava agências reguladoras, setores do governo, para medidas que beneficiassem Cachoeira. Não apenas isso. Em um dos trechos da Operação Monte Carlos, Cachoeira é flagrado falando da importância de dispor de jornalistas a seu serviço e anunciando, para breve, uma enorme reportagem sobre educação. Em outro trecho, aparece acertando com o Secretário de Educação de Goiás um projeto de construção de escolas no padrão do modelo chinês. Pouco tempos depois, Veja publica uma matéria de capa enaltecendo justamente o modelo chinês e o modelo de construção de escolas. Pode ter sido uma mera coincidência, pode ser uma parceria em um setor – a educação pública – em que tanto Cachoeira quanto Roberto Civita vem investindo. A CPI esclarecerá. Mas o trabalho de Civita, através da Veja, não ficou nisso. Quando a Polícia Federal deflagrou a Operação Satiagraha, Veja publicou um conjunto de capas inverossímeis, falsas, em defesa do banqueiro Daniel Dantas. Usou dossiês falsos para atacar Ministro do STJ que votou contra os interesses de Dantas. Os métodos de Civita chegaram ao auge na reportagem sobre o falso grampo – que teria gravado conversa entre Demóstenes e o presidente do STF Gilmar Mendes – e no dossiê falso sobre contas de autoridades no exterior.

Agências reguladoras - 1

O Ministério do Turismo apresentou números de sua pesquisa de satisfação com estrangeiros. Os dois itens pior avaliados – depois de infraestrutura – foram os das companhias aéreas e das telecomunicações, ambos os setores de concessões públicas. Hoje em dia há um enorme esforço para aumentar a eficiência gerencial do governo. No caso das concessões, bastaria às respectivas agências reguladoras fazer cumprir o contrato.

Agências reguladoras - 2

Essa inação das agências é tratado na literatura econômica como “captura” do regulador pelos regulados. Vários fatores contribuem para isso. De um lado, o melhor aparelhamento técnico dos regulados, com mais recursos para desenvolverem estudos favoráveis às suas teses. De outro lado, por oferecerem perspectivas de emprego melhor remunerados para os funcionários das agências, depois que deixarem o emprego.

Agências reguladoras - 3

O papel das agências deveria ser o de colocar em prática – de forma impessoal – os objetivos traçados pelo agente planejador – no caso, o governo através do Ministério da área. A partir daí devem ter autonomia para evitar interferências políticas que possam desviá-las da sua função. Mas quando a autonomia é ampla – como no caso brasileiro – as agências acabam sendo capturadas pelos regulados.

Agências reguladoras – 4

Por exemplo, no caso brasileiro, há muito tempo a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) deveria ter proibido as operadores de celulares de continuar a vender planos, enquanto não garantissem níveis mínimos de eficiência, previstos em contrato. Mas continuam a pleno vapor, mesmo não investindo na infraestrutura para acomodar a nova demanda. A leniência da Anatel é escandalosa, sem que o Ministério Público se pronuncie.

Agências reguladoras – 5

O mesmo acontece com a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil). A qualidade mitológica da Varig ou da TAM foi esquecida. Hoje há duas companhias praticamente monopolistas – TAM e Gol – revezando-se no campeonato de “quem trata pior seu cliente”. Voos são cancelados sem explicações maiores, ocorrem atrasos inexplicáveis, os bancos são apertados, o atendimento é pífio. E não se vê uma ação corretiva.

As agências reguladoras

A maneira encontrada pelos Estados Unidos foi a criação de uma agência das agências reguladoras. Trata-se de uma estrutura, acima das demais agências, incumbida de fiscalizar se elas estão cumprindo efetivamente os termos do contrato de concessão acertado com as concessionárias. É a melhor maneira de compatibilizar a necessária autonomia das agências, em relação aos governos, da independência que precisam ter, em relação ao mercado.
 
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