Sindicalismo Classista X Sindicalismo Corporativista:
a luta de classes no interior do movimento sindical brasileiro
União Popular Anarquista – UNIPA - Comunicado # n º10 – Rio de Janeiro, Outubro de 2005.
As organizações de luta do proletariado brasileiro, criadas nos anos 1980, degeneraram. A CUT (Central Única dos Trabalhadores), criada para servir como arma de luta pelos direitos dos trabalhadores, transformou-se na prática, num instrumento da burguesia. Para formular hoje uma alternativa de luta popular-sindical, é preciso refletir criticamente sobre as causas desta degeneração. E pensar um modelo alternativo de sindicalismo.
Um fator fundamental na degeneração da CUT é a estrutura sindical e a relação político-ideológica que os militantes e dirigentes sindicais estabeleceram com esta estrutura. Em primeiro lugar, é preciso indicar que existe um tipo de estrutura sindical no Brasil e que esta estrutura tem uma história. Ela surge a partir dos anos 1930, quando depois da “revolução burguesa”, é sistematizada a legislação sindical e trabalhista. Em 1943 foi criada a CLT (consolidação das leis trabalhistas), inspiradas diretamente na Carta del Lavuoro, de Mussolini (ditador fascista italiano). Logo, a estrutura sindical brasileira é um legado do fascismo italiano e do autoritarismo fascista de Getúlio Vargas.
Esta estrutura é feita para que o movimento sindical sirva aos interesses da burguesia, e não aos interesses do proletariado. Vejamos um artigo da CLT que define a essência do sindicalismo de estado:
“Art. 513: São deveres dos sindicatos:
d) colaborar com o Estado, como órgãos técnicos e consultivos, no estudo dos problemas que se relacionam com a respectiva categoria ou profissão liberal.
Art. 514: São deveres dos sindicatos:
e) colaborar com os poderes públicos no desenvolvimento da solidariedade social.”
Ou seja, o primeiro principio desta estrutura sindical, é a colaboração de classes. Sua essência é o corporativismo. Esta ideologia (colaboracionista e corporativista) é expressa fielmente na organização sindical. Ela tem três mecanismos principais: 1) a investidura sindical; 2) o imposto sindical; 3) a unicidade sindical. Os artigos 516 da CLT estabelecem a “unicidade sindical”. O que é a unicidade sindical? É o dispositivo que reconhece somente um único sindicato representativo de uma mesma categoria numa mesma base territorial. Isto significa que quem “investe” o sindicato do poder de representar os trabalhadores, é o Estado, através do Ministério do Trabalho. Sobre o princípio da unicidade sindical, se estabelece a estrutura sindical vertical, que divide os trabalhadores na base e os centraliza na cúpula, através do atrelamento direto ao ministério do trabalho e ao Estado. O Imposto sindical é um mecanismo de regulação, que obriga o sindicato a se voltar em grande parte de suas atividades para atividades assistencialistas (assistência médica, funeral).
O surgimento do novo sindicalismo através das oposições sindicais (1964-1978), levaria a uma critica desta estrutura sindical.
“Como se vê, este não é um sindicato que sirva ao trabalhador. A atual estrutura sindical foi criada pelos patrões contra os operários e isso é uma estrutura anti-operária. O papel da oposição sindical é o de desmantelar a atual estrutura e construir uma nova, independente dos patrões e do Governo, a partir da organização da fábrica.” (Tese da Oposição Sindical Metalúrgica de São Paulo, 1979).
A CUT nasce então sobre a base da critica desta estrutura, e acreditavam alguns, para destruir a estrutura do sindicalismo de Estado. Como então a CUT degenerou e se tornou instrumento dócil nas mãos da burguesia?
Para entender então como a CUT degenerou, devemos então correlacionar dois fatores: 1) as contradições internas da CUT; 2) o desenvolvimento de uma força e projeto política hegemônico reformista, através da relação “Partido-Sindicato.” (o PT). A CUT apesar de criticar a estrutura sindical, não levou a crítica até as últimas conseqüências, de maneira que permitiu que seus sindicatos continuassem atrelados ao Estado.
Além disso, uma grande parte da militância cutista estava integrada no PT, que tinha um projeto de participação no Estado burguês; a participação na democracia burguesa entra em contradição com a critica do sindicalismo de Estado. Em pouco tempo, o “eleitoralismo” se impôs, e a critica da estrutura sindical e seu modelo de movimento foi sacrificada em favor dos interesses do Partido (PT). Isto porque para que o PT ganhasse a confiança da burguesia, foi preciso frear as lutas proletárias (especialmente as greves). E esta estrutura sindical favorece exatamente a paralisação das lutas do proletariado. Mas o que opor ao sindicalismo corporativista ou sindicalismo de estado?
A este sindicalismo corporativista devemos opor o sindicalismo classista e o sindicalismo revolucionário. O que é o sindicalismo classista? Podemos dizer que o sindicalismo classista e o sindicalismo revolucionário surgem, conjuntamente, num determinado momento histórico: o da primeira geração do movimento socialista da AIT (Associação Internacional dos Trabalhadores), fundada em 1864.
Com a fundação da AIT, se estabelece um estado de espírito fundamental, expresso na máxima “a libertação dos trabalhadores é obra dos próprios trabalhadores...” No primeiro congresso da AIT (1866) são lançados os pilares do sindicalismo classista: 1) luta do trabalho contra o capital; 2) solidariedade de classe, tendo por base as reivindicações econômicas (da qual a reivindicação da jornada de 8 horas e os fundos de socorro mútuo eram os principais instrumentos naquele momento); 3) a ação direta, ou seja, o reconhecimento de que somente a luta dos trabalhadores é capaz de realizar sua libertação.
O sindicalismo classista toma por base a luta de classes, o classismo; a atual estrutura sindical brasileira toma por base a colaboração de classes, o corporativismo. È óbvio então que, qualquer organização proletária que não critique e aponte para a liquidação desta estrutura sindical, tenderá a degenerar como a CUT, ou pelo menos, se imobilizar nas contradições por ela geradas.
Quais as características do sindicalismo classista? Além da luta de classes, da solidariedade econômica e da ação direta, uma característica fundamental é a greve. Ou seja, a luta direta do “trabalho contra o capital”. Para perceber como a CUT negou estes princípios, basta ver que entre 1990 e 1997, o número de greves e de grevistas recua, por conta da “reestruturação produtiva”, mas também pela estratégia política adotada pelo setor majoritário da CUT (articulação sindical), que investiu num sindicalismo corporativista, e conduziu os trabalhadores a esta opção. Isto significa que os tipos de greve também se modificaram: as greves por empresa passaram a representar a maior quantidade de greves, enquanto que as greves gerais por categoria diminuíram.
Podemos então afirmar que a critica e destruição do sindicalismo de estado ou corporativista é condição necessária (apesar de não suficiente) para o desenvolvimento da luta de classes no Brasil, para a defesa efetiva dos interesses dos trabalhadores. Ao sindicalismo corporativista devemos opor um sindicalismo classista. Isto significa um sindicalismo que prioriza a luta de classes, a solidariedade econômica, a ação direta e as greves gerais por categoria, e sua coordenação em formas de organização e luta inter-sindicais, de baixo para cima.
Do ponto de vista revolucionário, o desenvolvimento do sindicalismo classista é estratégico, pois, somente em meio à hegemonia do sindicalismo classista pode se desenvolver o sindicalismo revolucionário. O desenvolvimento do sindicalismo revolucionário (primeiramente como estado de espírito, depois como tendência e finalmente como direção do movimento de massas), é pré-condição da revolução socialista. Por isso, a palavra de ordem revolucionária hoje é: destruição da estrutura de sindicalismo de estado, construção do sindicalismo classista.
Ir ao Povo – Lutar para Organizar, Organizar para Lutar!
Construir o Poder Popular !